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Auxílio Brasil: a reformulação do Bolsa Família e os reflexos eleitorais para Bolsonaro em 2022

27 de agosto de 2021

Reportagem da Semana 

Por Larissa Guedes

 

 

A MP do Auxílio Brasil foi entregue por Bolsonaro aos presidentes das Casas Legislativas no dia 9 de agosto de 2021. Imagem: Reprodução Câmara dos Deputados.

 

No dia 9 de agosto, o presidente Jair Bolsonaro entregou ao Congresso Nacional a Medida Provisória 1061/21, que estabelece a reformulação do Bolsa Família em um novo programa chamado “Auxílio Brasil”. A MP também substitui o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) pelo novo Alimenta Brasil. No dia seguinte, 10, saiu a publicação da MP no Diário Oficial da União e agora ela está em tramitação no Congresso. 

 

A formulação central do Auxílio Brasil constitui o benefício em 9 modalidades diferentes, sendo 3 delas as básicas: Benefício Primeira Infância; Benefício Composição Familiar (para famílias com jovens de até 21 anos incompletos) e Benefício de Superação da Extrema Pobreza (para os casos das famílias em que mesmo já incluídas nas modalidades anteriores, a soma da renda per capita não supera a linha da extrema pobreza).

 

No entanto,  além dos benefícios das modalidades principais, existem espécies de “bônus” que podem ser acumulados e concedidos para aqueles que cumprirem requisitos determinados pelo programa. São eles: Auxílio Esporte Escolar (para estudantes de 12 a 17 anos que se destaquem em jogos escolares brasileiros); Bolsa de Iniciação Científica Júnior (12 parcelas mensais para estudantes com bom desempenho em competições acadêmicas e científicas); Auxílio Criança Cidadã (para pais e responsáveis que não encontrem vagas em creches para deixar os filhos de até 48 meses); Auxílio Inclusão Produtiva Rural (pago por até 36 meses aos agricultores familiares inscritos no Cadastro Único); Auxílio Inclusão Produtiva Urbana (para quem já é beneficiário do Auxílio Brasil e comprove vínculo de emprego com carteira assinada) e o Benefício Compensatório de Transição (para famílias que tiveram prejuízos no valor do benefício durante o período de substituição do Bolsa Família pelo Auxílio Brasil). 

 

A estratégia de usar “bônus” como incentivo foi criticada por economistas e especialistas, que apontaram os riscos de que determinadas exigências de excelência para receber o valor dos bônus possam desvirtuar o sentido original do programa de combate à desigualdade social e à extrema pobreza. 

 

Para o historiador e professor da Universidade do Estado da Bahia (UNEB), Ricardo Moreno, programas de transferência de renda como o Bolsa Família são os que devem estar mais acessíveis para as pessoas, sem imposições para o recebimento do benefício. 

 

“Se você estabelece exigências e critérios para que as pessoas possam receber o programa que vão burocratizando o acesso, você vai afastando do objetivo final justamente as pessoas que estão na maior faixa de risco e exposição social. Obviamente deve haver fiscalização para que se evite abusos, mas acredito que o que o governo federal pretende fazer, além de limitar erroneamente o acesso das pessoas que vão receber o auxílio, é ter controle social para poder chegar até essas pessoas com objetivos outros que não o do papel social de uma ferramenta como essa”, argumenta o professor.

 

Uma vez promulgada a MP do Auxílio Brasil, terá início o processo de transição entre programas com prazo determinado de 90 dias, para que o Bolsa Família seja totalmente substituído. Durante este período de transição, o governo estabeleceu o citado recurso “Benefício Compensatório de Transição” para cobrir os prejuízos das famílias que recebiam regularmente o Bolsa Família e possam vir a perder parte do valor dos recursos durante a substituição. 

 

O ministro da Cidadania, João Roma, afirmou que a intenção do governo é aumentar o número de beneficiários do programa, incluindo mais 2 milhões de pessoas. De acordo com o ministro, se a MP for aprovada, o governo pretende começar a realizar os pagamentos já no mês de novembro. Para que a MP não caduque, ela precisa passar pela aprovação de ambas as Casas Legislativas em um prazo máximo de 120 dias. Caso não ocorra, a medida perde a validade. 

 

O professor Ricardo explica que a intenção de Bolsonaro ao despersonalizar o Bolsa Família é tentar apagar da memória da população brasileira as origens do programa e a forma como foi implantado desde o primeiro governo do ex-presidente Lula para criar uma marca própria. “Ele pretende dizer que apresentou um programa, sendo que na verdade está apenas mudando o nome, alterando as regras e restringindo as pessoas beneficiárias para chantagear politicamente. A alteração do nome tem um objetivo de propaganda, de tentar desvincular a imagem do governo popular deste tipo de benefício e trazer para si”, explica o docente. 

 

A estratégia dos precatórios de Guedes: calote do governo pode custar caro a Bolsonaro 

 

O ministro da Economia, Paulo Guedes, e o presidente Jair Bolsonaro. Imagem: Reprodução Carta Capital.

 

A grande discussão nos entornos do Planalto é a definição do valor do novo programa. Atualmente, o valor do Bolsa Família corresponde a cerca de R$ 189. Para o Auxílio Brasil, Bolsonaro fez promessas altas: o presidente afirmou que vai aumentar em pelo menos 50% o valor do benefício, chegando em torno de R$ 280. Embora alguns setores do governo defendessem que o valor fosse de R$ 400, o ministro da Economia, Paulo Guedes, estabeleceu que o limite máximo do benefício poderia ser de R$ 300 reais, alegando a necessidade de não ultrapassar o orçamento da União para não furar o teto de gastos.

 

Ainda em 2020, o governo já tentava lançar um novo programa no lugar do Bolsa Família. Na época, para emplacar a medida, Guedes argumentava a favor da implantação de um imposto nos moldes da antiga CPMF, o que foi altamente criticado e rapidamente rejeitado pelo mercado, por políticos e pela sociedade civil. Depois, tentou sugerir a utilização de recursos do Fundeb para pagar as bolsas, o que também foi mal visto, e por último, tentou sugerir o calote no pagamento de precatórios, ou seja, das dívidas do governo. Nenhuma das sugestões foi aceita. 

 

Agora, para defender a implantação do Auxílio Brasil com o aumento do valor pago pelo programa, Guedes insiste mais uma vez no calote das dívidas da União para ter de onde extrair os recursos. 

 

Para o professor do curso de pós-graduação em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade (CPDA) e do curso de Relações Internacionais na Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), Luiz Felipe Osório, o teto de gastos é em si um veto explícito às políticas sociais. Ele analisa a estratégia dos precatórios: “O que se faz quando declarações desse tipo são colocadas é a boa e velha barganha, ou seja, para ceder e abrir mão de um mínimo de gasto social, ele exige o máximo de esforços e estrangulamento das parcelas da sociedade que dele dependem, limitando em vários sentidos as possibilidades do crescimento nacional a partir somente do mercado interno”, declara o docente. 

 

Já o professor Ricardo Moreno considera que a manobra é uma pedalada fiscal escancarada e agressiva que expressa o nível de desespero que o governo Bolsonaro se encontra com a sua baixa popularidade e as projeções eleitorais que se apresentam para 2022.

 

“O governo tenta fazer isso sem passar pelo Congresso, então isso tem consequências do ponto de vista político. Para quem o Estado deveria pagar esse débito, passa um recado muito ruim de falta de seriedade e de compromisso, além do que isso é uma manobra ilegal. E isso cai em crime de responsabilidade de forma escancarada, mais um pra conta de crimes de responsabilidade que vem sendo cometidos pelo presidente e por esse governo”, pontua o professor.

 

Diante do evidente calote, o professor Luiz Felipe analisa que os interesses dos capitais tanto nacionais quanto internacionais estão muito mais direcionados para os lucros do que diretamente com a imagem do Brasil no exterior com parceiros comerciais, por exemplo. “Desde 2016, a preocupação da atuação e da intervenção do Estado na economia (o Estado mínimo dos neoliberais não existe na prática) é quase que exclusivamente com os tais investimentos externos (os quais contribuem quase nada em capacidade produtiva). Logo, a preocupação deve estar centrada nos efeitos nefastos que o possível calote dos precatórios pode vir a gerar na população”, alerta ele.

 

O internacionalista argumenta que é necessário olhar para as contas públicas e as intenções de alcançar um equilíbrio orçamentário, mas sem ignorar os efeitos destas questões no desenvolvimento socioeconômico da população. “O ensinamento de grandes economistas brasileiros, como Maria da Conceição Tavares, alerta para o fato de que brasileiro não come PIB. Não adianta estarmos em equilíbrio nas contas públicas, e as pessoas morrendo de fome nas ruas. Caso contrário, acontece o que vivenciamos hoje, uma política econômica, em nome somente da austeridade, cortando todo apoio social ao desenvolvimento, minando o futuro e a esperança de várias gerações”, defende Luiz Felipe.

 

Se a MP for aprovada, para pagar as prestações do Auxílio Brasil nos meses de novembro e dezembro de 2021, o governo vai precisar solicitar ao Congresso uma alteração no atual orçamento. 

 

Mira nas eleições de 2022: as intenções políticas de Bolsonaro com a MP 1061/21

O presidente Jair Bolsonaro durante cerimônia no Palácio do Planalto. Imagem: Reprodução ISTOÉ.

 

Atualmente, o Bolsa Família contempla cerca de 14 milhões de famílias compostas por crianças e adolescentes de até 17 anos em situação de pobreza (com renda per capita entre R$ 89 e R$ 178) ou extrema pobreza (com renda per capita de até R$ 89 por mês).

 

Com a chegada da pandemia em 2020, a aprovação do auxílio emergencial de R$ 600 (por conta dos esforços do Congresso, já que o governo queria que o valor pago fosse de apenas R$ 200) reduziu temporariamente os índices de extrema pobreza no Brasil. De acordo com dados da Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios do IBGE, a PNAD Covid, divulgados em junho de 2020, no período do mês de maio do mesmo ano a redução da pobreza caiu de 25% para 22% e a extrema pobreza, de 5% para 3,5%. 

 

Inevitavelmente, esses números refletiram na popularidade de Bolsonaro, que viu sua aprovação chegar a 37% em agosto de 2020, segundo a pesquisa Datafolha divulgada na época. No entanto, com a redução do valor do auxílio para R$ 300 a partir de setembro de 2020, a popularidade do presidente voltou a cair. Em dezembro do mesmo ano, os efeitos da redução já haviam colocado cerca de 7 milhões de pessoas de volta no nível de extrema pobreza, de acordo com um estudo realizado pelo FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getúlio Vargas).

 

A partir de 2021, com uma redução ainda maior no auxílio, a crise econômica disparou: a inflação, os preços dos alimentos, da gasolina e da energia aumentaram drasticamente, contribuindo para o agravamento das desigualdades sociais. Segundo uma pesquisa feita pelo Centro de Pesquisa em Macroeconomia das Desigualdades da USP em abril de 2021, as previsões são de que até o final deste ano, o país tenha cerca de 61 milhões de pessoas vivendo em condições de pobreza e uma média de 19 milhões em extrema pobreza. 

 

Por conta destes fatores, o professor Ricardo considera que a necessidade de aumento do valor de um programa social de transferência de renda como o Bolsa Família é inevitável. “Você já não consegue adquirir a mesma coisa com o valor que você tinha antes. Então, se não houver um reajuste no valor da bolsa, ela não vai alcançar o seu objetivo, porque a população vai comprar menos com o mesmo valor. Por outro lado, é uma sinuca de bico para o governo que necessita manter ou ampliar o alcance social do número de famílias beneficiadas para tentar obter algum tipo de saldo político. É uma operação muito difícil já que o próprio governo alega ter dificuldades em financiar o programa”, explica.

 

Já o professor Luiz Felipe aponta que políticas públicas como as de transferência de renda e de renda básica universal são urgentes, especialmente em contextos de crises e colapsos sociais, mas que suas possibilidades de alcance acabam sendo limitadas por conta dos tetos estruturais do capitalismo. 

 

“Considerando o Estado como um fator central no estímulo das economias nacionais (para dentro e para fora de seu território), as políticas de transferência de renda funcionam, em geral, como uma alavanca do consumo, sendo fartamente empregadas em países desenvolvidos. Em países periféricos, elas se tornam ainda mais essenciais, pois dadas a pobreza e a carestia, em muito produto das próprias relações internacionais desiguais, para além do consumo, elas determinam vida e morte das pessoas. Ou seja, em espaços, nos quais imperam uma profunda desigualdade social, em que as possibilidades de morte por fome ou por carestia são reais e cotidianas, tanto a transferência de renda quanto outras políticas sociais correlatas são imprescindíveis” elucida o docente.  

 

Para o professor Ricardo, como o governo Bolsonaro não tem em sua concepção a assistência social como prioridade, a articulação do programa neste momento pode ser interpretada como uma estratégia com intenções eleitorais para 2022. “Não vejo este governo ser voltado para os mais pobres, o atendimento às necessidade deles, por concepção mesmo porque tudo o que vem do próprio governo, até mesmo pelo tratamento que ele deu à crise sanitária, à postura do governo desde a sua implantação. Talvez eles tentem uma medida momentânea para dar uma resposta eleitoral, mas até para fazer isso eu vejo limitações no governo de traçar isso como uma prioridade, porque para eles isso não é, nunca foi e nunca será”, conclui.

 


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